Pode parecer
estranho, mas o Brasil não "existe" só a partir de 1500, com a
chegada de Pedro Álvares Cabral e companhia. Também não estamos falando dos
índios que aqui moravam quando os portugueses chegaram. A arqueologia brasileira é vasta em achados:
temos fósseis de mais dez mil anos, isso sem falar em desenhos rupestres e
restos de fogueiras que podem ser os mais antigos da América, que contestam
inclusive as teorias norte-americanas sobre a entrada dos primeiros povos no
continente. Por que, então, esta
faceta brasileira é tão pouco valorizada? A resposta pode estar na cultura. “No Brasil, nosso olhar é sempre do país do
futuro, ocorre um apagamento do passado. Diferente de países como México e
Peru, o Brasil é construído e pensado a partir da chegada dos portugueses. A
gente apaga tudo o que veio antes. Por isso que temos essa relação com as
comunidades indígenas, de apagamento e exclusão. A partir do momento que você
divulga a idéia de que o Brasil é miscigenado você apaga tudo que vem
antes"
"Nós
temos nosso Machu Pichu que é a Serra da Capivara. Falta vontade para
divulgar". A frase de Louise Affonso mostra um pouco da realidade de um
dos maiores parque de sítios arqueológicos do mundo e patrimônio mundial da
Unesco.Localizado no Piauí, a 510 km de Teresina, o Parque Nacional da Serra da
Capivara reúne pinturas rupestres de milhares de anos, além de uma região com
vegetação e paisagem que impressionam. Mas por que vive em constante risco de
fechar e é pouco visitado?
Em
agosto, a Fumdham (Fundação Museu do Homem Americano), responsável pelas
pesquisas e manutenção do local, disse que, por causa da falta de verbas,
fecharia as portas. O parque, contudo, segue aberto, mas pode ver sua
qualidade cair bastante. O número pequeno de visitantes (até 20 mil por ano)
pode ser atrelado à falta de divulgação, mas também à falta de estrutura local.
"Falta divulgação, mas sou a primeira a dizer que não adianta. Se você faz muita divulgação, vai
criar expectativa, gente querendo vir e não tem onde receber. Não
se pode provocar a vinda de turistas enquanto a hotelaria não for melhor,
restaurante não for melhor. A cidade mais próxima, São Raimundo do Nonato, tem
esgoto a céu aberto. Para mim, criando as condições de funcionamento dos
acessos, a estrutura da cidade e de hotelaria, o público vai vir", diz
Rosa Trakalo, coordenadora
de Projetos da Fumdham.
Um
aeroporto próximo ao parque foi inaugurado após promessas desde o fim da década
de 90, mas, segundo a coordenadora da Fumdham, só leva aviões de até nove
passageiros que saem lotados de Teresina rumo a outras escalas. As estradas da
região sofrem com buracos e más condições, apesar de incentivos do governo
local. Infraestrutura hoteleira e de restaurantes quase não existem na
área. "A verdade é que não sei dizer o que falta. Eu não acho que seja mal divulgado,
vemos reportagens especiais sobre o parque. Nunca vai ser um turismo de massa,
isso é evidente. Aquela pessoa que quer pegar um sol na praia
com cerveja do lado não quer vir aqui. Mas em um país com mais de 200 milhões
de habitantes vai ter muito interessado. Falta criar estruturas e depois fazer
publicidade paga. Inclusive se vierem grupos de hotelaria grandes, eles mesmos
vão divulgar", desabafa Rosa.
Você
sabia que o Brasil tem um "stonehenge" próprio? E que a costa do Sul
e do Sudeste tem várias estruturas pré-históricas ignoradas até por moradores
da região? Pois é. O Brasil tem importantes registros arqueológicos, mas
enfrenta um grande problema em relação aos concorrentes: não existem grandes
monumentos que por si só despertam a curiosidade de turistas. Por aqui, não há
pirâmides misteriosas como no Peru, Egito ou no México. Sem isso, o que sobra
para o turista? O principal local de turismo arqueológico no país é mesmo
a Serra da Capivara, que tem vestígios humanos, como pinturas rupestres e
fogueiras, que teriam mais de 40 mil anos, segundo estudos.
Mas
o país é riquíssimo também em outros achados, como os de Santa Elina, que mostram a presença do homem por
aqui muito antes do que diz a teoria que o homem teria chegado
às Américas pelo estreito de Bering, entre os EUA e a Rússia, há 13
mil anos. O crânio de Luzia, encontrado em Minas Gerais, mostra a presença do
homem na América do Sul há cerca de 12 mil anos - o que também não era esperado
pela teoria norte-americana. O Brasil conta ainda com sambaquis pelo litoral do
Sul e Sudeste -- montes de conchas e ossos de animais que muitos nem sabem que
são estruturas arqueológicas. Mas, em sua maioria, nossa arqueologia é formada
por sedimentos como pedras lascadas e afins, que não geram apelo ao
visitante comum.
Se
a gente for comparar o Brasil com o México, não quer dizer que os indígenas
deles sejam melhores, quer dizer que as condições geográficas deles obrigaram a
construir casas de pedras que duram até hoje. No Brasil, nossos indígenas
moravam em lugar de material orgânico. Os sítios que nós temos com mais apelo
são de arte rupestre. Grande sítio era de pedra lascada. “A maioria é um pasto
e as coisas que a gente coletou têm pouco apelo para turismo”
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